Houve uma época em que o melhor Carnaval do Planalto Norte de Santa Catarina era realizado em Canoinhas. Do final dos anos de 1970 até o início dos anos de 1990, quatro dias antes da Quaresma, a juventude canoinhense se reunia nos blocos de rua e nos club
REPORTAGEM: BRUNA WERLE*Publicada originalmente no Jornal Correio do Norte em 21 de fevereiro de 2020.
Uma década marcada pelas fantasias, marchinhas, desfiles e quatro noites de alegria, agitação e muita dança. De 1979 à 1990 dois blocos formados por uma geração dedicada, participativa, competitiva, motivada, determinada e unida, competiam de igual para igual para energizar o clima do carnaval de rua e clubes de Canoinhas.
O Carnaval, embora tenha sua origem greco-romana, nas festas dedicadas à Baco (ou Dionísio, para os gregos), o Deus do vinho, no Brasil é ele considerado a maior festa popular do país, fazendo parte da sua identidade nacional. E ele é celebrado de diversas formas, adaptando-se à cultura do lugar. Em Canoinhas, a festa tinha o apoio da secretária de esportes e turismo, na época comandada por Elói Bona (in memoriam).
Na cidade, dois clubes investiam e lotavam seus salões de foliões. A Sociedade Beneficente Operária (SBO) e o Cube Canoinhense, cada um com o seu público. “Na SBO não existia a formação de blocos e desfile de rua. Já o Clube Canoinhas tinha dois blocos que impulsionavam o Carnaval. O Moçada Dependente comandado por Polaco Preto, e Unidos da Maloca, liderados pelos irmãos Davet e Mauricio Nascimento”, conta Clauto Padilha, organizador do Carnaval de 1987.
Com alegorias, fantasias, baterias, porta bandeira, carros alegóricos e até concursos de fantasias de luxo, o carnaval começava a ser organizado no mínimo quatro meses antes, com ensaios da bateria, sambas enredo, elaboração de fantasias, reuniões, esquentas e muita agitação. “Carnaval não se faz em um dia. Em novembro iniciávamos os preparativos, para quando chegasse o dia, todo mundo já estava contagiado clima de Carnaval”, lembra Padilha.
“Eu amava demais o Carnaval. Meu maior sonho era meus pais deixarem pular as quatro noites. Até que consegui!”, conta Isabel Cristina Bossi Dias, atual administradora do grupo Baú da Felicidade 1920 – 2019, na rede social Facebook, onde amigos dividem lembranças e memórias antigas. Foi entrando em contato com este grupo, que a redação do CN teve acesso à maioria das fotos e depoimentos de alguns foliões da época.
O CARNAVAL DE 87
O inesquecível Carnaval de 1987, foi uma das últimas festas carnavalescas em Canoinhas. Promovido por Clauto Padilha e finalizado pela diretoria do Clube Canoinhense, na época, o ano foi marcado pela vitória inesperada (e injusta para alguns) de um bloco recém-formado.
Neste ano, um grupo de jovens, liderado por Alexey Sachweh (Porcão), criou o bloco Kakara e KaKorage, entrando para a competição. Aliás, falta de liderança, segundo Padilha, é o motivo pelo qual a festa acabou. “Todo bloco deve ter um Cristo, que carrega a equipe nas costas. Hoje em dia não existe mais uma figura que tenha esse perfil”, opina o carnavalesco.
Ao longo da rua Major Vieira, o primeiro bloco a desfilar foi o Unidos da Maloca, que com o tema Sorte e Azar. Em seguida, entrou a Moçada Dependente, e, fechando o desfile de 87, o bloco Kakara e Kakaroge, apresentou o tema de Magia, com uma ala de garotas trajadas de coelhinhas.
Nas escadarias do clube, encontravam-se os jurados que julgaram os blocos, que eram acompanhados e assistidos por um grande público. Logo após o desfile de rua, os blocos e foliões invadiram o salão do clube, que apresentou durante a folia, um Concurso de Fantasias de luxo. “Foram mais três noites e duas matines daquele que eu considero o melhor carnaval que Canoinhas já teve”, afirma Padilha. Durante os desfiles de rua em frente ao clube, subitamente a luz dos postes tiveram um apagão e praticamente boa parte do desfile foi feito com a iluminação de holofotes cedidos pelo bloco Unidos da Maloca.
A música ficou por conta do Grupo Agenda (banda de pop rock da época formada por Claudiomar, Yashushi, Silvio Franco e Adir Padilha). Foram usados três sopros vindos de Mafra. O conjunto de som (PA) que animou o carnaval de salão era do Ari Soares de Lima, que ainda divulgou e fez alguns esquentas na rua com seu caminhão de som. E nos intervalos a bateria da Moçada Dependente mantinha a folia.
Em uma noite de carnaval de salão, Marcio Theodovicz, o Piri, foi trajado de mulher e concorreu de igual para a igual com as beldades do carnaval. No concurso de fantasias do clube, o bloco Moçada Dependente apresentou Moreno Scopel e Angie Fleith, que arrasou na passarela do clube. A apresentação da candidata à rainha do carnaval do bloco Unidos da Maloca foi feito por Mauricio Nascimento, e a apresentação da candidata à rainha do bloco Moçada Dependente foi feita de improviso por Clauto. Mas, foi o bloco Unidos da Maloca que venceu o concurso de fantasias de luxo, realizado no interior do clube.
Padilha conta que na última noite era para os blocos fazerem um segundo desfile de rua, mais isso não aconteceu por causa da revolta dos blocos perdedores. O carnaval de 1987 foi vencido pelo bloco Kakara e Kakorage. O melhor e penúltimo Carnaval acabou sob protestos e revolta dos blocos Unidos da Maloca e Moçada Dependente que por causa das notas de um jurado, se sentiram prejudicados, e prometeram nunca mais desfilar.
“O jurado era um senhor de idade, que de nada sabia sobre Carnaval, convidado pelo Clube. Ele tinha netos no bloco vencedor e as suas notas foram divergentes. Para o Kakara e Kakorage ele deu 10 para todos os quesitos. Para o Moçada, nota 3. E para o Unidos, 1. Isso quebrou as demais notas dos jurados, que davam nota 9, 7, 8. Foi inocência da parte dele, talvez pela idade, mas que gerou uma grande revolta”, conta Padilha. Se as notas dele tivessem sido canceladas, o bloco Unidos da Maloca seria o campeão do carnaval de 1987.
O ÚLTIMO CARNAVAL
Três anos depois, em 1990, o carnaval de Canoinhas tentou reagir com a presença dos blocos Moçada Dependente e Kakara e Kakorage desfilando. Para este Carnaval, Clauto Padilha havia criado um novo grupo, chamado Unidos por Acaso, com a pretensão de reunir em um único bloco, todas as classes sociais. “Mas misturou muito as classes, e como tinha muita discriminação naquela época, o bloco perdeu força. De 150 pessoas, restaram apenas 15”.
Mesmo com todos os instrumentos e sabendo que o Unidos por Acaso não vingaria, Padilha participou da reunião na prefeitura, onde foi definido o local do desfile. “Estrategicamente pedi para mudar a rua para a Paula Pereira, pois queria uma rua neutra, que não beneficiasse nenhum clube. Isso foi o meu escape do Carnaval, pois eu já estava sem bloco.
O desfile aconteceu em frente ao Clube Canoinhas e foi o último a ser realizado na cidade. “Infelizmente como tudo que é bom, dura pouco, o último carnaval de rua que Canoinhas teve foi esse mesmo de 1990. Daí para frente à cidade perdeu definitivamente a tradição do carnaval”, conta. Os blocos de carnavais viraram equipes das Gincanas da Cidade que participaram de 10 edições promovidas por Padilha.
O hino da Kakara e Kakoragem
Adir Padilha, músico da cidade, lembra que em uma noite do ano de 1986, apresentando-se no Clube Pink House apareceu um rapaz pedindo-lhe para criar uma música para o Bloco Kakara e Kakoragem. O estrebilho surgiu na hora e a música foi escrita em um pedaço de guardanapo. “Ô Malandragem, ô malandragem, estamos aí com a cara e com a coragem. Eu nem achei que eles iam aceitar, e acabaram até registrando a música”, conta o músico.
Melhores carnavalescos dos blocos da época: Polaco Preto, Ademarzinho Murara, Beto Davet, Ricardo Davet, Nardo, Alexey Sachweh (Porcão), Gilson, Marques Antonio (in memorian) e Marcio Theodorivicz (Piriquito).
CURIOSIDADE
Você sabia?
A data do Carnaval é definida por meio do critério que é utilizado para determinar a data da Páscoa. Esse critério foi criado no ano de 325 d.C. durante o Concílio de Niceia. As autoridades da Igreja Católica estipularam que a data da Páscoa seria marcada no primeiro domingo que acontece após a primeira lua cheia depois do equinócio de primavera/outono. Em seguida, contam-se retroativamente sete domingos para se chegar ao Domingo de Carnaval. É por isso que, diferente dos demais feriados, o de Carnaval não tem um dia fixo, ao contrário, ele muda de acordo com o ano (e a lua).
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