O CN inicia hoje série de reportagens sobre a influência do crack na criminalidade protagonizada por menores de idade
Na primeira reportagem, a história de Joãozinho*, menino de 13 anos, viciado desde os 11 que já perdeu as contas de quantas vezes furtou para comprar drogas.
“Comprei tudo em pedra”
Há cinco dias sem fumar crack, menino de 13 anos garante que consegue parar sozinho
Edinei Wassoaski
CANOINHAS
Delegados, policiais, conselheiros tutelares, juízes e promotores são unânimes em afirmar que o crack invadiu de vez o cotidiano de Canoinhas e região. Pior: a maioria dos assaltos e furtos cometidos na cidade está associada ao vício. O mais grave: a maioria dos que furtam para comprar a droga são menores de idade.
Familiarizado com delegacias, viaturas e a hostilidade peculiar desses ambientes, Joãozinho, 13 anos, não admite, mas já perdeu a conta de quantos furtos cometeu. Franzino, olhos fundos, cabelo desgovernado, sem camisa. É com hostilidade que ele recebe a reportagem do CN. “O que esse filho da p... quer comigo?”, vai logo perguntando. Joãozinho mora com a mãe e outros cinco irmãos. O pai foi embora há um ano, enquanto o menino estava internado no Centro de Internamento Provisório (CIP) de Lages. Desde então, Joãozinho não o vê. A mudança de humor é repentina. Agitado, anda de um lado para o outro e passa da hostilidade ao interesse rapidamente. Sem entender direito o motivo, aceita falar sobre a experiência que teve no CIP. Mas conta mais. Fala do vício que diz ter abandonado e dos furtos que cometeu e que promete não cometer mais. “Aonde mesmo que você disse que trabalha?”, pergunta no meio da entrevista, quando então entende que é personagem de uma reportagem. “Traga um jornal pra mim sexta-feira”, pede abrindo um esboço de sorriso e quebrando totalmente a má impressão causada pela recepção. A criança que existe nele ainda se empolga com alguma coisa. Acompanhe.
Você é viciado em crack?
Não.
Mas já foi viciado?
Faz cinco dias que não fumo.
Qual a sensação que o crack traz?
É boa.
Mas se é boa porque você largou?
Não dá né. Prejudica a gente.
Você já roubou pra comprar crack?
R$ 13 mil, uma vez.
O que você fez com o dinheiro?
Comprei tudo em pedra.
De quem?
Tinha um cara aqui que eu ligava e ele trazia pra mim, mas ele foi embora. Quem mandava as pedras era um cara de São Paulo.
Quantas vezes furtou?
Algumas.
Você furta porque não te dão quando você pede?
Dão sim. É muito melhor pedir, por isso que não vou mais roubar. Hoje mesmo pedi e ganhei uma panelada de comida num restaurante.
Você já assaltou casa de policial?
Já. Me meteram bala, não quiseram nem saber. Eles querem me matar.
Você já apanhou da Polícia?
Já, várias vezes.
Já foi internado no CIP?
Já.
Recebeu alguma medida educativa lá?
Não. No primeiro dia já fui pra traz de uma porta preta, fiquei lá 10 dias, só recebia a comida. Depois me levaram pro pátio. Foi quando pulei com uma chave de fenda num monitor.
Por que você pulou no monitor?
Ficava me enchendo o saco.
Aí você saiu de lá?
O juiz mandou me buscar. Fui pro Peti, ganhei um monte de roupa lá, vendi tudo pra comprar pedra.
Você já teve em uma clínica de recuperação de drogados?
Fiquei um mês lá, aí queriam me dar uma injeção. É louco! Saí de lá, pulei o muro.
Mas você acha que consegue se livrar do crack sozinho?
Consigo.
*Por ser menor de idade, o nome do menino é fictício
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