Série de reportagem do CN vai explorar um assunto antigo, mas que recentemente ganhou visibilidade por conta da movimentação popular: a extração do minério de Xisto em terras do Planalto Norte
Há oito anos, começaram as pesquisas. Em cada propriedade, os pesquisadores usavam uma justificativa diferente para adentrar ao terreno, cavar um poço e retirar dali, uma pequena quantidade do subsolo. A comprovação de que a área é uma mina de xisto almejada por uma empresa canadense se concretizou no segundo semestre de 2018, quando voltaram para realizar os estudos.
As terras que antigamente serviram de palco para a Guerra do Contestado entre 1912 e 1916, hoje são novamente contestadas. A região do Planalto Norte de Santa Catarina é alvo de empresas estrangeiras que querem extrair do solo, a pedra de Xisto para produção de gás e óleo de combustível, principalmente para a indústria.
Conhecida pelas belezas naturais, ecoturismo e economia essencialmente agrícola, as paisagens das cidades do norte do Estado catarinense estão prestes a mudar, caso a empresa Irati Petróleo e Energia, empreitada no Brasil da canadense Forbes & Manhattan, comece a colocar em prática seu plano de extração.
O Brasil é o segundo país com as maiores reservas de xisto do mundo, espalhadas pelos estados de São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Por volta dos anos de 1950, a União catalogou que a extensão territorial às margens da BR-116 de Curitiba (PR) à Monte Castelo (SC) é privilegiada com uma quantidade significativa do minério de Xisto betuminoso, uma rocha sedimentar resultado das transformações sofridas durante milhões de anos por resíduos vegetais, encontrada a poucos metros do subsolo brasileiro.
Fácil de ser extraído e valorizado mundialmente estima-se que a quantidade de óleo produzido a partir da refinação da rocha é quatro vezes maior que as reservas de petróleo existentes. Os produtos que podem ser gerados com o material são óleo combustível, gás combustível, gás liquefeito e enxofre, além de itens que podem ser utilizados nas indústrias de asfalto, cimenteira, agrícola e de cerâmica. No entanto, o método de extração é caro, trabalhoso e com pouco retorno econômico ao município, além de causar irreparáveis impactos ambientais e na saúde.
Projeto Piloto
O município de Papanduva, foi o primeiro alvo da empreiteira, que iniciou os estudos de sondagem do folhelho ainda em 2011. Três anos depois, o empreendimento da empresa Irati Petróleo e Energia encontrava-se na fase de planejamento, que incluía o licenciamento de uma Instalação Provisória de Pirólise de Xisto em Escala Piloto, conhecida como Planta Piloto. No dia 29 de maio de 2014, aconteceu uma reunião entre os representantes da empreiteira e membros da Administração Municipal, na sede da Prefeitura, afim de acertar informações sobre o Projeto do Xisto e status do licenciamento ambiental.
Segundo matéria publicada no site da Associação dos Municípios do Planalto Norte Catarinense (Amplanorte), a unidade piloto tinha como objetivo reproduzir as condições do processo de uma unidade de porte industrial, mostrando os efeitos das condições de operação nos resultados obtidos. Na época, para instalação da Planta Piloto a empresa estava esperando a Licença Ambiental de Instalação (LAI) que deveria ser emitida pela extinta Fundação do Meio Ambiente (Fatma), atual Instituto do Meio Ambiente (IMA).
Para a obtenção da LAI, a empresa estava ainda elaborando um Plano Básico Ambiental (PBA), para a Instalação Provisória para Pesquisa Tecnológica de Xisto em Papanduva. Em busca no site do IMA, não foi encontrado o referido documento no período de maio a dezembro de 2011. No entanto, em 2012, um Estudo Ambiental Simplificado (EAS) foi elaborado para a mesma finalidade. E um ano depois, em 2013, foi feito um Relatório Ambiental Prévio (RAP) da extração de Xisto Betuminoso, além do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD).
Quatro anos depois da primeira reunião, na tarde de 16 de maio de 2018, o Governo do Município reuniu-se novamente com representantes da empresa, que expuseram o trabalho de viabilidade que deverá ser realizado no município. De acordo com a divulgação da Assessoria de Comunicação do município, durante o encontro, o geólogo Ricardo Sakamoto e a Assessora de Comunicação da empresa Warley Ribeiro, juntamente com o Prefeito Luiz Henrique Saliba e demais secretários, discutiram a realização do inventário de fauna e flora e o estudo prévio ambiental, a ser executado no município.
No dia 5 de abril deste ano, a prefeitura emitiu nota repudiando os atos e interesses das empresas mineradoras, tendo em vista que as tratativas aconteceram com a Administração passada, sem expor detalhadamente, em audiência pública à população diretamente afetada, e a forma como obtiveram os licenciamentos dos órgãos públicos para realizarem o seu intento.
"A administração pública de Papanduva, também na defesa do melhor interesse público e calcada principalmente no princípio da preservação e da precaução, até em razão e a exemplo das últimas catástrofes ambientais que a mineração vem causando no Brasil, bem como visando salvaguardar a vontade da ampla maioria de seus munícipes, inclusive por meio de abaixo assinado, registra que não medirá esforços para resistir e impedir não somente a vinda do empreendimento, mas também qualquer tipo de mineração de alto impacto destruidor na região", finaliza o documento assinado pelo atual prefeito, Saliba.
As empresas
A Forbes & Manhattan é um banco privado líder de mercado com foco global no setor de recursos, Agricultura, Tecnologia e Telecomunicações. A Irati, Energia, criada em 2011, e com sede em Curitiba (PR) é detentora dos direitos de pesquisa do xisto betuminoso do Sul do Brasil, que tem como meta 8 mil barris por dia de produção inicial.
A empresa controla 100% de uma área territorial de 3.100 km² de propriedades, e seus poços contem 93 mil metros de perfuração histórica, o que indica um recurso potencialmente superior a dois bilhões de barris de óleo. Essa produção pretende suprir a demanda por mais de 30 anos.
Conforme o projeto embasado em pesquisas prévias, a empresa prevê a produção de 25 mil barris de petróleo por dia, somente na sua primeira instalação, com oito retortas (reatores).
No entanto, xisto é uma fonte de energia não renovável e finita, ou seja, apesar da grande quantidade de reserva, um dia acabará. O processo de extração do minério, pelo método Petrosix, é altamente agressivo ao meio ambiente, contaminando a água e a longo prazo causa diversos problemas de saúde à população.
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